A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL PODE DESTRUIR A FOTOGRAFIA
A frase pode ser um pouco radical, mas a chamada inteligência artificial vem aí para mudar completamente as coisas, não só na fotografia e no vídeo, mas em muitos setores da sociedade. A inteligência artificial por enquanto é apenas um chavão de marketing e trata-se nada mais que estatística e comparação, não existe nada de inteligente e tem tudo de artificial.
Os benefícios da internet e da cloud (nuvem) estão a criar a segunda grande revolução da sociedade de informação… e informação é precisamente no que a inteligência artificial se baseia, milhões e milhões de imagens são guardadas em servidores e depois comparadas por softwares especiais (neural networks) que “escolhem” o que lhes interessa e aplicam nas novas imagens, resultando daí um aglomerado estatístico e comparativo.
As empresas estão cada vez mais a adotar o termo AI (artificial intelligence) nos seus produtos e alguns exemplos dessa tecnologia estão a começar a aparecer e são extremamente populares. A conhecida “FaceApp” usa estes algoritmos de comparação para tornar a nossa cara 30 anos mais velho e os resultados são impressionantes. A “Deep Nostalgia” pega numa foto estática e fá-la voltar à vida, dando por exemplo a Mozart ou Albert Einstein “vida” novamente, eles piscam os olhos, olham para um lado ou outro, tudo isto resulta do processo e da facilidade com que informação é manipulada, para o computador uma fotografia é apenas uma coleção de números, zeros e uns. A cor é um número, os olhos são números, o céu ou uma árvore são números e a alteração desses números de uma forma exata transformam como nós quisermos tudo sobre essas imagens e vídeo. E prova disso vai continuar a acontecer cada vez mais, como a “Remini app” que torna as fotografias desfocadas, novamente focadas com um detalhe nunca visto ou a impressionante e automática colorização de filmes antigos.
A manipulação analógica já existia desde a invenção da fotografia na câmara escura, mas o computador veio dar um novo leque de ferramentas à população. Por exemplo se quisermos preencher o céu da nossa paisagem com nuvens, ou até mudar a altura do dia para um pôr-do-sol magnífico também já é possível com o softwareLuminar AI. Outras funcionalidades impressionantes são a aplicação instantânea de maquilhagem, tornar os lábios mais vivos ou os dentes brancos em vez de amarelos, mudar a iluminação original adicionando mais pontos de luz e até mesmo simular a desfocagem: “bokeh” como é conhecido, que as máquinas mais profissionais fazem. Tudo isto é feito através do computador e por isso são tudo simulações aproximadas da realidade. Realidade essa que irá ser consideravelmente mais fácil e automática de ser simulada. Mas irão as pessoas abraçar esta falsidade e manipulação ou regressar para algo mais “realista” e “genuíno” no futuro.
As empresas e os interesses económicos vão abraçar certamente e a tendência é para ser ainda mais disruptiva, como foi o caso da empresa Data Grid que criou modelos virtuais através da sua rede especializada neurológica (neural network), tudo completo com poses, roupas… centenas de pessoas virtuais criadas a partir do nada… salvo seja, tudo fruto do processo estatístico e comparativo de milhões de exemplos reais. E algumas coisas já estão a ser comercializadas como foi o caso da Vogue que usou modelos 3D virtuais em algumas das suas capas de revista. As modelos Noonoouri e Shudu Gram não existem, só em computador, mas representam claramente uma pessoa quase indistinguível da realidade. O problemático disto é que estes seres digitais podem “ganhar vida” nas redes sociais, terem canais de youtube, terem filhos ou viajar, tudo virtualmente… tudo a favor do marketing e das vendas de produtos.
Outro exemplo, “deep fakes”, onde um ator faz uma “performance” imitando um ator conhecido da vida real ou um Presidente da República, essa “performance” é depois manipulada digitalmente, com a cara da “pessoa real”, tornando-se indistinguível da realidade, incluindo a sua própria voz que é manipulada também, tornando esta falsa realidade num pau de dois bicos. Isto quando é feito em tom de brincadeira em que todas as partes estão informadas e foram feito acordos, está tudo bem, mas todos nós sabemos que esta tecnologia nas mãos erradas pode criar problemas sérios e destruir vidas reais e terá de ser mais cedo ou mais tarde ser regulamentada.
A fotografia no seu longo caminho desde a sua invenção veio da noção de mostrar a realidade como ela é para um universo totalmente fabricado e falso. A chamada inteligência artificial está a chegar não em forma de Robô ou Humanoide pensante como no filme “Terminator” mas vai certamente mudar completamente o panorama de muitos setores e postos de trabalho na indústria, vai mudar a forma como tiramos e vemos o conceito da fotografia e do vídeo, a inteligência artificial vai criar duas realidades, a (falsa) virtual e a real e pode tornar a fotografia como nós a conhecemos… num nicho.
ESPAÇO ALFA - Artigo de Mauro Rodrigues publicado no Caderno de Artes Cultura.Sul de abril de 2021
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